Em “Girl” uma mulher trans quer mudar o seu corpo (e ela tem pressa)

Baseado na história da bailarina Nora Monsecour, filme belga tem protagonista cisgênero e uma delicada visão sobre o longo processo de readequação de gênero


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Baseado na história da bailarina Nora Monsecour, filme belga tem protagonista cisgênero e uma delicada visão sobre o longo processo de readequação de gênero

Lara tem quinze anos e sonha em seguir carreira de bailarina. Após entrar em uma renomada companhia de dança, ela precisa se esforçar para merecer estar na instituição, ao mesmo tempo que longe dos ensaios ela se prepara para uma cirurgia de readequação de gênero, apoiada por sua família.

Com fotografia belíssima, movimentos leves e visão delicada, o filme vai mostrando, ou flutuando, pela melancólica vida de uma mulher que não se sente uma, e seu processo para a resignação sexual, passando pelos hormônios e pela terapia com um psicólogo especializado. Enquanto não chega o dia da cirurgia, Lara se esforça para esconder o seu órgão sexual – e esse é um trabalho que pode ser doloroso.

O castigo do pênis

Lara utiliza fita adesiva ou uma espécie de esparadrapo para esconder o volume do seu pênis nas aulas de balé. A tarefa é arduamente repetida todas as manhãs e a dor é angustiosamente transmitida para o público. Com a fita espremendo o seu órgão sexual, ela não consegue dançar o quanto poderia e ainda fica impossibilitada de se hidratar nos treinos tomando água, para não precisar ir ao banheiro urinar e ter que retirar aquilo que aperta seu pênis. E a fita machuca, sangra. Mas a vergonha de mostrar um volume nas calças é pior, na visão de Lara.

Eu não sou uma mulher

Quando seu pai pergunta “acredita que quando te olho eu vejo uma mulher?”, Lara diz sem nenhuma dúvida “não”. Isso está muito ligado a visão de que o órgão sexual define o gênero de uma pessoa. Enquanto seu pai fica preocupado com os efeitos colaterais dos hormônios que ela começa a tomar e com a cirurgia irreversível que ela está se preparando para fazer, Lara está sem medo algum e não vê a hora de se livrar daquele órgão que julga não lhe pertencer. A sua dor está concentrada no pênis e ela pensa que sua vida só começará de verdade quando ele não mais existir no seu corpo.

Intruso na história, ou não

Muito se discutiu sobre o ator que interpreta Lara ser um homem cisgênero. Falou-se que o papel deveria ser interpretado por uma mulher trans, já que possuem pouco espaço no cinema, sendo impedidas até de interpretar papéis de personagens trans também. De fato seria incrível que Lara fosse interpretada por uma mulher trans, mas as críticas só devem ficar aí, não chegando a performance de Victor Polster, que foi escolhido para vivê-la no longa. O ator simplesmente mergulhou na personagem, ele conseguiu comover, trazer uma visão mais delicada e intima sobre o que é ser transexual. Inclusive o ator foi escolhido pela própria Nora Monsecour, a bailarina que é a “Lara da vida real”, e portanto a produção está longe de ser aquilo que é chamado “filme trans para cis ver”, pois o longa também foi co-produzido por ela, que acompanhou tudo de perto. “Girl” é um ótimo filme LGBTQI+ longe dos estereótipos e profundo na sua própria intimidade.

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