Filme do diretor Babis Makridis é uma silenciosa tragédia grega digna de ser apresentada na pólis ateniense
Rastejante, elusivo, brilhante, com cheiro forte. Como classificar a obra “Pity”(2018)? É muito improvável conseguir definir o sentimento final proporcionado pelo filme de começo silencioso que cresce progressivamente e choca o espectador de forma inesperada, seguindo o caminho pavimentado pelo contemporâneo cinema grego.
A história gira em torno de um homem, de nome não revelado, e da dor que ele sente pela sua esposa estar em coma há bastante tempo e pelas expectativas serem apenas aguardar que ela enfim morra. O protagonista vive esse sofrimento, desde o despertar da manhã, passando pelo almoço com seu filho, até o retorno do trabalho. Por sentir tanto, a tristeza passa a ser uma parte inseparável desse homem e com o tempo vemos que ele sente prazer em apreciá-la.
Já quase sendo considerada como morta, esposa acorda do coma, se recupera e a vida de todos volta ao normal. O acontecimento, digno de comemoração, não é recebido muito bem pelo protagonista que, tão acostumado a sofrer, não consegue lidar e reconhecer a felicidade. Cria-se um vazio existencial, quase um “não-sentir”.
Com o retorno de sua esposa e a volta à normalidade, o homem deixa de receber a atenção, piedade e compaixão que seus conhecidos depositavam na época em que sua parceira estava internada. Esses afetos são tão necessários para sua existência, que ele vai até o inimaginável para conseguir recuperá-los.
É aí que a tragédia grega se inicia de forma silenciosa e que só é percebida pelo espectador após o desastre acontecer. Se o homem gosta tanto de sofrer, a morte de sua mulher significaria um sofrimento e consequentemente um prazer eterno. Como o acidente que a levou ao coma não foi capaz de matá-la, esse papel ficou destinado a ele.
Não apenas a morte da esposa, mas também o assassinato de outros familiares marcou a volta desse sofrimento e o prazer desse homem que prefere viver em um mundo sem carnaval.

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