Provavelmente você já percebeu que hoje se apaixonar tem sido cada vez mais difícil, mesmo que a barreira da distância para conhecer novas pessoas tenha sido superada graças à tecnologia. Não somente é mais difícil, mas se apaixonar parece ter se tornado um mal negócio., uma perda de tempo, um gasto de energia. Os relacionamentos agora parecem ser acordos de comum interesse que já nascem com a crença de que logo mais irá acabar.
Mas será que sempre foi assim? Com muito humor e inteligência, e o título emprestado de um verso da poeta norte-americana Hilda Doolittle, “A rosa mais vermelha desabrocha” examina as engrenagens do amor nos tempos do capitalismo tardio.
A autora sueca Liv Strömquist cria uma obra que mescla ensaio e quadrinho para fazer uma análise histórica dos relacionamentos desde a Grécia Antiga, onde Sócrater traiu Alcibíades, até os dias de hoje, onde Leonardo DiCaprio não consegue sentir nada pelas mulheres com as quais ele se relaciona.
Desaparecimento do outro
Um dos pontos que Liv traz ao leitor é como se apaixonar pelo outro no passado estava relacionado a um olhar de que aquele ser era único, singular, insubstituível. Algo transcendental pelo qual você seria capaz de morrer caso perdesse. Hoje se relacionar se tornou uma busca por alguém que seja parecido com você, e a possibilidade de inclusive usar filtros nos aplicativos de relacionamento para encontrar exatamente pessoas com as características que você quer faz com que você sinta utilizando um cardápio, e com essas pessoas você não se envolve, e sim as consome. O grande volume de resultado das suas buscas específicas torna o seu parceiro substituível, possível de ser trocado caso haja o menor dos conflitos.
Racionalização dos afetos
Herança da modernidade, a racionalização massiva das coisas, conta Liv, aqui funciona para matar o amor. O motivo é que se apaixonar pressupõe alguma metafísica, um misticismo, algo que não se pode explicar. O fato de querermos tratar as relações como planilhas de excel e fazermos esforço para controlar tudo acaba destruindo a paixão, já que se apaixonar é justamente perder o controle.
Revanche masculina
Por muito tempo homens tiveram o poder em suas mãos, frequentando lugares exclusivos para eles, sendo a única fonte de renda na casa e a voz mais assertiva da família. Com o passar do tempo as mulheres foram conquistando esses espaços, acabando o monopólio masculino. Não tendo mais o poder de antes, a forma que os homens encontraram de retomar um certo controle é colocando o mínimo de si nas relações, dominando suas parceiras pelo emocional. Não bastasse os homens assumirem essa postura, agora as mulheres, para serem valorizadas, estão imitando-os.
Não há saída
Depois de levantar tantos pontos, é normal esperar que Liv apresente uma solução. No entanto, parece não haver uma. Isso pode causar um certo desespero em quem leu a obra, pois todas as problemáticas que aparecem no livro irão acontecer quer você queira ou não.
Obra de conteúdo universal
Muitos podem criticar a autora por ter feito esse recorte e não ter explorado as outras formas de se relacionar, como relacionamento aberto ou poliamor. No entanto, seria muito difícil a autora não se perder nessa seara. Embora Liv foque nos relacionamentos heterossexuais e monogâmicos no livro, é fácil se identificar com o conteúdo reunido nos quadrinhos. A acurácia de seu trabalho faz com que Liv Strömquist seja uma das quadrinistas mais urgentes de nosso tempo.
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