Se “Mau Comportamento” marca o momento histórico pós-contracultura em que a liberdade e a sexualidade estavam sendo experimentadas, “Isso é Prazer + A Dificuldade de Seguir as Regras”, da mesma autora Mary Gaitskill, mostra como as relações se tornaram higienizadas, mapeadas, e travadas por um feminismo que entra até dentro do quarto do casal. Não é um livro para todos, pois grande parte das pessoas não está preparada para o que ele aborda.
Na primeira parte da obra, “Isso é Prazer” é um pequeno conto narrado por dois personagens: Quin, um prestigiado editor de literatura que é acusado por assédio sexual por uma ex-funcionária; e Margot, a amiga de Quin que acompanha o caso e se questiona se o amigo é realmente um abusador ou se a ex-funcionária é uma vaca.
O conto é provocador porque nos faz pensar se hoje não existe uma certa banalização do que é assédio sexual, pois na história Quin não violenta, imobiliza, ou atravessa de forma alguma sua ex-funcionária. O seu crime aqui foi acariciar o cotovelo dela. Surpreendentemente, depois de ser acusado de assédio sexual, várias outras mulheres surgem para pedir sua punição também por crimes de assédio sexual, mas retroativos, como se depois de anos essas mulheres tivessem acordado e pensado “o que ele fez comigo vinte anos atrás também foi assédio”.
E muito parecido com o que acontece na vida real, a punição que pedem não é apenas que ele passe um período na prisão ou que pague indenizações em dinheiro, e sim que a vida dele acabe, que ele não consiga frequentar nenhum outro lugar ou arrumar trabalho em outra editora.
Já na segunda parte da obra, “A Dificuldade de Seguir as Regras” é um ensaio escrito por Gaitskill sobre date rape (estupro em encontros amorosos), cultura da infantilização e responsabilidade do indivíduo. Nele, a escritora conta de um estupro que ela acreditava ter sofrido e que depois de anos ela percebeu que não foi bem assim.
O estupro em questão foi porque ela quando jovem transou com um conhecido de uma amiga, mas que o sexo não foi totalmente consentido por ela não estar totalmente à vontade. Um estupro que se caracteriza como tal porque, apesar de não ter dito “não”, a autora não disse “sim” com todas as letras. É meio confuso.
Mas influenciada pelo feminismo, Gaitskill passou a acreditar que foi estuprada e, para tornar o relato mais real, passou a contá-lo para pessoas de forma hiperbólica, inserindo elementos de violência física.
No ensaio, então, a escritora vai chamar a atenção de como as mulheres passaram a ter uma imagem infantilizada, frágil e submissa em relação ao sexo, praticamente o oposto do que se viu no seu livro de contos “Mau Comportamento”, que possui histórias como casos de escritório, que hoje nunca poderiam acontecer sem que a mulher fosse até o compliance da empresa denunciar que está sendo cantada por um colega de trabalho.
“Isso é Prazer”, Mary Gaitskill
Editora Fósforo
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